A pandemia do Covid-19 gerou inúmeras perdas para o País (até o momento, já são mais de 400.000 mil vidas brasileiras perdidas) de ordem pessoal e, também, financeira. A crise econômica foi, ou melhor, ainda está sendo devastadora para o Brasil.
O setor energético, assim como outros ramos, também foi atingido. O consumo de eletricidade caiu fortemente em vários territórios em função de grandes períodos de estabelecimentos fechados desde o começo da pandemia. Agora, as empresas que sobreviveram a essa crise precisam se reorganizar e pensar estrategicamente em como se adaptar enquanto a vacinação caminha a passos lentos.
A Full Energy entrevistou especialistas para esclarecer quais foram os reflexos da Covid-19 em diversos setores da matriz energética.
Petróleo
Heloísa Borges, diretora de Estudos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis da EPE (Empresa De Pesquisa Energética), explica que, ao final de 2019, a expectativa para o setor petrolífero era de crescimento para o ano de 2020 no Brasil e no mundo.
Heloísa explica que, em abril de 2020, havia no mundo três bilhões de pessoas em lockdown, quase metade da população mundial. Neste momento, foi registrada uma sequência de reduções no setor: 46% de redução de tráfego aéreo no mundo, 82% de redução de venda de querosene de aviação no Brasil, 26% de queda de produção do refino nacional, 32% de queda de venda de gasolina C no Brasil, o que gerou uma revisão do PIB brasileiro para -5% nos meses seguintes.
A demanda mundial de petróleo, consequentemente, caiu em -10,8 milhões de barris (queda de 60%). O setor sofreu não apenas os efeitos destas bruscas mudanças, mas também da revisão de expectativas.
Heloísa aponta ainda que, apesar de outras frentes do setor também apresentarem grande reflexos, como as atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, houve um setor que teve menores impactos: as energias renováveis e os biocombustíveis. “Esse fato permite que o Brasil atue de modo a tornar a indústria de biocombustíveis mais competitiva. ”
A diretora cita, inclusive, uma publicação que a EPE lançou específica sobre o reflexo da pandemia nos mais diversos setores: “Balanço Covid-19 – Impactos nos mercados de energia no Brasil: 1º semestre de 2020”.
Energia Eólica
Com a energia eólica o impacto da Covid-19 foi pouco diferente. De acordo com Elbia Gannoum, presidente da ABEEólica, é preciso separar os efeitos da pandemia em curto, médio e longo prazo.
Ela explica que, para a indústria eólica, o mercado livre foi uma boa saída para a crise. Como o ACL (Ambiente de Contratação Livre) já era mais importante que o ACR (Ambiente de Contratação Regulada) para eólicas desde 2018, isso deu uma opção para seguir o ano com um bom número de novos contratos, mas todos graças ao mercado livre.
No que se refere a pedidos para cadeia produtiva, Elbia analisa que não há impactos no momento, em função das fábricas estarem produzindo hoje aerogeradores, pás e torres eólicas para parques que são fruto de leilões realizados ou contratos no mercado livre nos anos anteriores, para entregas nos próximos anos. Ela justifica que produzir equipamentos para o setor eólico é um negócio de longo prazo.
“O ponto é que a crise de demanda que estamos vivendo fará com que as contratações sejam pequenas e a retomada vai depender da velocidade com que nossa economia vai se recuperar. Não existe dúvida, no entanto, de que a expansão da matriz elétrica se dará por meio de renováveis, com forte destaque para a eólica, dados seus preços competitivos. Portanto, ainda que as contratações sejam menores, entendemos que as eólicas farão parte disso”, explica Elbia.
Sucroenergético
Já o setor sucroenergético teve uma grande preocupação no começo da pandemia da Covid-19 com a possível inadimplência das distribuidoras de energia elétrica com relação aos contratos firmados com os geradores nos leilões regulados.
Zilmar de Souza, gerente de bioeletricidade da UNICA, conta que graças a edição da Medida Provisória 950, houve a preservação do fluxo de pagamento das distribuidoras e, por consequência, dos geradores, o que garantiu maior estabilidade.
“Quanto às operações das unidades, as atividades do setor sucroenergético foram consideradas essenciais pelas autoridades e não puderam parar durante a pandemia, conforme Decreto 10282/2020 do Governo Federal e Decreto 64.879/2020 do Governo do Estado de São Paulo. Assim, foram adotados rígidos protocolos de sanidade e segurança a fim de proteger a saúde dos colaboradores e de seus familiares. Mas as atividades continuaram via remota”, afirma o gerente de bioeletricidade da UNICA.
Perspectivas para 2021
Apesar da espera que 2021 seria um ano melhor, é possível observar que o cenário ainda será de incertezas, embora existam bons resultados. Heloísa Borges explica que as estimativas para este ano apontam comportamentos distintos para os combustíveis.
Segundo a diretora, no caso do de óleo diesel e do querosene de aviação, os volumes comercializados serão superiores às vendas registradas no ano anterior.
No que tange às vendas do ciclo Otto, que abrange gasolina C e etanol hidratado, Heloísa afirma que há perspectivas de recuperação gradual, com crescimento dos volumes de gasolina C para patamares próximos aos observados em 2019, ainda em 2021.
No caso do etanol hidratado, em virtude dos preços competitivos do açúcar no mercado internacional, espera-se uma retração dos volumes comercializados no ano corrente. As vendas de GLP devem manter o desempenho, em virtude do aumento da cocção de alimentos nas residências, com volumes similares ao contabilizado em 2020.
Diante das incertezas associadas aos efeitos da pandemia da Covid-19 na economia e na sociedade brasileira, a EPE iniciou, ainda em março de 2020, o desenvolvimento de uma série de estudos com vistas a analisar os potenciais impactos de curto prazo no mercado nacional de combustíveis.
Dando continuidade aos estudos realizados sobre essa temática, em 2021, a EPE elaborou o documento “Perspectivas para o mercado brasileiro de combustíveis no curto prazo”, uma publicação bimestral que apresentará as projeções de vendas dos principais combustíveis e biocombustíveis no País e, em breve, este primeiro caderno estará disponível em www.epe.gov.br. Mas já posso adiantar que ele já reflete uma recuperação em alguns segmentos.
Zilmar de Souza aponta que, mesmo com a pandemia em 2020, a geração pela biomassa continuou avançando durante toda safra 2020/21, que começou na Região Centro-Sul justamente em abril de 2020, primeiro mês completo de isolamento social.
“Em 2021, a previsão é que a biomassa instale 481 MW novos na matriz elétrica brasileira, representando 7,8% do total previsto a ser agregado à matriz elétrica por todas as fontes de geração (6.197 MW), o que ajudará a bioeletricidade a manter sua geração estratégica e renovável para a rede elétrica brasileiro neste ano. ”
Ele ainda concluiu que, em 2020, a bioeletricidade ofertada para a rede pelo setor sucroenergético cresceu 1% em relação a 2019, com um volume de 22.604 GWh. Por ser de baixo carbono, estima-se que essa geração tenha evitado a emissão de 6,3 milhões de toneladas de CO2, marca que somente seria atingida com o cultivo de 44 milhões de árvores nativas ao longo de 20 anos.
Fonte: Full Energy