Há a projeção de que 94 parques eólicos exclusivamente voltados para o mercado livre entrem em operação até 2024, agregando potência instalada de 3 GW ao país, segundo levantamento da Brasil Energia a partir de dados da Aneel. Do total destes projetos acompanhados pela agência desde os atos de outorga, 22 estão com obras em andamento (717,44 MW), sendo sete com previsão de entrada em operação em 2020 e os outros 15 até agosto de 2021.
Os demais 72 projetos estão em etapas intermediárias, pré-obras, com PPAs e contratos com fornecedores em negociação, sendo a maioria do total dentro do cronograma normal (60), com apenas dois, a ser entregues em 2024 – o Mundo Novo VI e o Cumaru II, ambos no Rio Grande do Norte e da EDP Renováveis –, ainda em processo de licenciamento ambiental.
Os projetos são liderados por grandes empreendedores da área, como a Enel Green Power, com 15 projetos 100% ACL que totalizam 468,7 MW; a Neoenergia, com mais 15 projetos com total de 594,4 MW; Engie, com 11 projetos (Campo Largo, BA), de 361,2 MW; EDP Renováveis, com seis projetos com 198,6 MW; e a Echoenergia, com sete usinas da Serra do Mel (RN), com 247,8 MW, com entrega em curso. Além desses, entre outros grupos com menos projetos, se destacam a Brennand Energia, com mais três parques na Bahia, com total de 93,3 MW, e a Copel, com dois projetos com potência total de 71 MW.
Expectativa
Os dados conrmam a tendência de migração dos contratos do setor eólico para o ACL desde 2018. Segundo estimativa da Abeeólica, em 2018 e 2019 foram negociados pelo setor 4 GW de energia em contratos no ACL, contra 2,38 GW no ACR. Atrás dos melhores preços dos contratos bilaterais do mercado livre, os empreendedores passaram a comercializar em média apenas 30% da energia ofertada para as distribuidoras nos leilões, deixando o restante para negociar no ACL. Somada a essa estratégia de casar atuação comercial nos dois ambientes – o que facilita nanciamento de longo prazo e conexão ao SIN – a implantação de projetos 100% livres promete ganhar cada vez mais importância.
E a boa expectativa deve se manter, apesar do cenário volátil pós-crise sanitária, que provocou redução no consumo e queda nos preços de energia. Mesmo que a situação tenha provocado uma paralisação temporária nas várias negociações de PPAs em andamento para estruturar projetos não iniciados, para o responsável em energia do project nance do Banco Santander, Igor Fonseca, a tendência é a de que passados os primeiros meses da pandemia haja retomada das negociações.
“Mesmo com os impactos econômicos da crise, para os grandes consumidores industriais e do varejo o custo de energia será sempre signicativo. Com a recessão, que deve provocar baixa nas vendas, a saída para eles será se concentrar na redução de custos, o que vai continuar a acontecer com a energia renovável”, explica Fonseca.
Para ele, a suspensão temporária afetou projetos na fase de captura de PPAs e anteriores à construção. “Ninguém vai querer assumir um compromisso de longo prazo em um momento de incerteza”, diz.
Dentre o universo de projetos no ACL, na opinião de Fonseca, aqueles com mais problemas são os que iniciaram obras com recursos próprios dos acionistas, depois de ter assinado PPAs, e que ainda não haviam contratado as dívidas. “Eles vão sofrer algum impacto nas taxas de juros e nos custos nanceiros, o que ocorre em um ambiente de escassez de liquidez”, diz. O executivo fala com a propriedade de quem opera para um banco como o Santander, repassador de recursos de bancos de fomento, emissor de anças bancárias e estruturador de projetos com carteira total no mercado livre de 2,9 GW, sendo 1,6 GW apenas de eólicas.
Já os projetos em construção e com dívidas contratadas, ainda segundo Fonseca, podem sofrer alguns atrasos. Isso porque há cidades do interior do Nordeste que restringiram a mobilidade de entregas de componentes para os parques e outras que dicultaram a continuidade dos canteiros de obras. Além do atraso, esses obstáculos também colocam em risco os desembolsos dos nanciadores dos projetos, sejam eles o BNB, BNDES ou bancos comerciais. “O credor precisa ter o conforto de que a obra vai continuar”, diz.
Atrasos
As interrupções de obras em construção, porém, passaram a ser revertidas com ações junto a governos estaduais e municipais, que na maioria das vezes reiteraram as operações do setor de energia como essenciais ao mesmo tempo em que exigiram medidas extras de segurança sanitária.
Um projeto 100% para o mercado livre da Engie, por exemplo, na Bahia, o Campo Largo Fase 2, está em construção e sem sobressaltos, segundo informou o diretor de comercialização, Gabriel Mann. Com entrega prevista para julho de 2021, o projeto foi negociado com 121 clientes de diferentes pers de consumo, dos setores de telecomunicações, supermercadista e de comércio. Outro projeto que não sofreu parada, já na reta nal de instaslação, é o Folha Larga Sul, da Casa dos Ventos, na Bahia, que fornecerá energia para a Vale.
Aliás, um outro agente nanceiro envolvido com projetos eólicos no ACL, o chefe de project nance do Itaú BBA, Marcelo Girão, não tem percebido demanda por renegociação de contratos de projetos com suprimento de energia para 2021 ou 2022. “Esse pessoal sabe que, quando o suprimento começar, o período crítico vai ter passado, com a volta da estabilidade, o que tem feito os projetos avançarem”, arma.
Já para contratos vigentes, e dependendo da contraparte, há noticações de declaração de força maior e renegociação. “Mas na maioria das vezes é de boa fé, para reperlar o contrato e mantendo o valor econômico, sem ruptura”, completa Girão. Para ele, as renegociações, com perspectivas de longo prazo, devem caminhar para a reavaliação de volumes negociados, o que pode ser uma boa saída para comprador, com perspectiva de menor consumo, mas também para o vendedor.
O cenário, porém, para o vice-presidente de project nance do Itaú BBA, Wilson Chen, exige cautela no curto prazo, postergando as negociações de contratos, mas não tira a atratividade dos projetos para o ACL. “Os preços de curto prazo desabaram, caram próximos dos pagos nos leilões para as eólicas, mas a curva do longo prazo não mexeu tanto, o que permite a continuidade”, diz.
Um exemplo ocorre com a Engie. Segundo Gabriel Mann, além do projeto de Campo Largo em construção, outro em elaboração adiantada para o mercado livre e dividido em 24 SPEs, o Conjunto Eólico Santo Agostinho, no Rio Grande do Norte, de 800 MW, não deve sofrer contratempos no seu planejamento de entrega de suprimento em 2022. “É um projeto bastante competitivo e não vemos risco de inviabilidade na sua implantação por causa da pandemia. Até lá a economia terá se recuperado e os compradores sabem disso”, diz Mann.
PLS 232
Há quem considere também que, mais do que os efeitos econômicos da pandemia, uma causa mais palpável para mudar o cenário futuro dos projetos eólicos no ACL será a aprovação do PLS 232, o novo marco regulatório do setor em tramitação. Tem essa opinião Eduardo Tobias, especialista em investimentos em projetos de energias renováveis.
Para começar, explica Tobias, há uma expectativa de que no primeiro ano depois da aprovação do marco ocorra um boom no número de PPAs fechados. Isso porque está previsto no projeto uma carência de 12 meses até que os novos projetos de renováveis passem a pagar a TUST integral. “Para poder contar com o desconto atual de 50% da tarifa do o, muitos PPAs tendem a ser fechados rapidamente no primeiro ano do marco”, diz.
Um segundo aspecto do PLS, destaca o consultor, que vai impactar diretamente os projetos será a separação de lastro e energia. “Embora não esteja claro como será precicado o lastro para energia incentivada, de alguma forma vai onerar o consumidor que compra o PPA de um projeto eólico, que passará a ter um custo adicional”, explica.
Para Tobias, com o custo do lastro e o m da TUST, depois do término da carência, a tendência será ter mais projetos e contratos de geração no ACL no modelo de autoprodução de energia (APE), em detrimento dos produtores independentes. “A autoprodução paga menos encargos, continuará a ter isenção total da TUST sobre o volume autoconsumido, e aí vai se tornar mais competitiva do que a venda convencional do produtor”, explica. Nesse caso, os consumidores entram como sócios dos empreendedores nos parques, normalmente como sociedades de propósito especíco (SPEs).
Fonte: Brasil Energia
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