Considerado durante muitos anos um dos maiores desafios de fontes renováveis como a eólica e a solar, a expansão para o ambiente de contratação livre vem ganhando mais musculatura nos últimos anos. Em 2018, uma série de eventos mostraram que o movimento tomava força.Em agosto, a Casa dos Ventos, uma das maiores desenvolvedoras de projetos eólicos do país, promoveu um leilão para venda de energia elétrica no ACL. Em novembro foi a vez da EDF Renewables anunciar um contrato com a Braskem para fornecimento de energia de um parque de 33 MW, extensão do complexo Folha Larga, na Bahia.Este ano, a mesma Casa dos Ventos divulgou que assinou com a Vale para a compra da energia produzida pela eólica Folha Larga Sul, de 151,2 MW. Ao término do contrato, a Vale poderá adquirir o parque. Comenta-se no mercado que a contratação total de energia eólica para o ambiente livre pode variar entre 2,5 GW a 3 GW, uma vez que nem todos os contratos são divulgados por estratégias de clientes.
De acordo com a presidente executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica, Élbia Gannoum, há uma procura pela energia eólica, uma vez que ela tem mostrado ser competitiva, pois ela é limpa, renovável e com uma indústria estruturada. “Ela é quem vai puxar a expansão nos próximos dez anos”, avisa a presidente da associação. Reginaldo Medeiros, presidente executivo da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia, lembra o número de consumidores especiais que cresce e os milhares que podem migrar para o ACL nessa condição de comprar energia renovável. “A sinalização é de uma abertura maior de mercado e os projetos estão saindo no sentido de atender esse mercado”, explica.Mas o que teria motivado essa forte expansão de renováveis no ACL? A conjuntura do setor dos últimos anos pode explicar o avanço. Desde 2015, a fonte vinha ficando abaixo da sua média de 2 GW, sendo que em 2016 não houve sequer contratação, com o cancelamento do leilão. Isso fez com que se pensasse em outros nichos de mercado. Ao mesmo tempo, houve uma queda forte dos preços da eólica, o que os tornava competitivos, capazes de ir ao mercado livre para serem vendidos. O leilão de 2017, em que os preços ficaram na casa abaixo dos R$ 100/ MWh, demonstrou que a fonte tinha fôlego para ser vendida no ACL.Essa forte redução nos preços das eólicas em 2017 e 2018 também é apontada por Paulo Abranches, CEO da EDF Renewables, como uma das razões para o deslanche de projetos no ACL. Segundo ele, muitos agentes do mercado viram que que a fonte ficou competitiva e abriu espaço para que grandes empresas e consumidores se comprometessem no longo prazo com projetos de preço e custo acessíveis. “Foi essencialmente a competição e o preço da eólica que desencadearam o interesse dos agentes e eles começaram a equacionar e se comprometer no longo prazo”, relembra. No anúncio do contrato com a Braskem, maior petroquímica das Américas e líder mundial em biopolímeros, o diretor de energia da empresa Gustavo Checcucci citou a redução 325 mil toneladas em emissões de CO2 como um dos motivadores para a viabilização do negócio.
A diretora da Cela Experts Camila Ramos também notou um acentuado aumento de projetos no mercado livre de energias renováveis. Para ela, o aumento de eólicas no mercado livre é considerado uma tendência global e não restrita apenas ao Brasil. A Cela atua na estruturação financeira de projetos de energia renovável. Ela também relaciona a queda nos preços da fonte ao aumento da competitividade dos projetos no ACL e a uma escassez de projetos em leilões regulados. A demanda de energia incentivada por parte dos consumidores especiais também foi outro aspecto que puxou essa alta de renováveis no mercado livre. “Sem dúvida tivemos um aumento bastante forte na segunda metade do ano passado e este ano continuamos percebendo”, destaca.Levantamento da Bloomberg New Energy Finance mostrou que até setembro de 2018 os novos PPAs bilaterais de eólica e solar somavam 8,4 GW no mundo, crescendo 70% na comparação com o 2017, quando o número ficou em 5,4 GW. Informações da Agência Internacional de Energia dão conta que o fornecimento corporativo de energia passou dos 465 TWh.Sempre que confrontado sobre o porquê de a fonte eólica não conseguir repetir no mercado livre a excelente performance que tinha no regulado, a principal justificativa era que a falta de financiabilidade impedia que se repetisse o desempenho. Nesse ponto os empreendedores e agentes financeiros conseguiram efetuar melhoras que possibilitaram a assinatura de contratos, aparecendo como mais uma das razões para o avanço no ACL. No Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – o principal agente financiador de projetos renováveis no país – houve um aprimoramento no mecanismo que foi benéfico. O banco passou a usar o modelo do PLD de Suporte, que melhorou a alavancagem dos projetos.Antigamente, o banco usava o PLD mínimo de R$ 40/MWh para a os projetos, o que fazia com que a receita prevista ficasse baixa, próxima de 40% a 50% do valor do investimento. Ao migrar para um PLD de R$ 90/ MWh, mais que o dobro do patamar anterior, a expectativa melhorou. Em evento realizado na última semana no Rio de Janeiro, o gerente da área de Energia do BNDES Alexandre Siciliano lembrou que o banco percebeu que tanto no ACL quanto no spot o investidor tem a capacidade de recontratar em níveis de preço acima ou próximo do valor do suporte. “Com isso o BNDES faz um movimento de tentar viabilizar ainda mais o ACL”, avisa.Fonte: Abraceel/Fevereiro de 2019Embora sem revelar os nomes dos empreendedores ou alguma especificação dos projetos, Siciliano revelou que atualmente o banco mobiliza em análise de crédito um total de 13 projetos que tem capacidade total de 2,7 GW. Ele contou a jornalistas na ocasião que a decisão do banco de alterar os parâmetros veio na esteira das mudanças do novo modelo do setor, em que o mercado livre aumenta e se expande definitivamente. Segundo ele, a concentração de contratos que predominavam no ACL, de curto e médio prazo, não era atraente para o financiamento. “É importante dar um valor de longo prazo que tenha um centro de risco importante, mas que seja adequado, previsível e que tenha uma sustentabilidade para o projeto com um nível de alavancagem adequado”, sinaliza. O BNDES também prepara um mecanismo de garantias volantes, em que as garantias e contratos são trocados ao longo de cinco anos.O longo prazo dos contratos bilaterais também contribuiu para que mais parcerias fossem fechadas. No caso da Vale com a Casa dos Ventos, o PPA é de 23 anos – o maior já assegurado por um parque no país – o que trouxe previsibilidade e iniciou tendência de mercado de aproximar os grandes consumidores dos geradores eólicos. O compromisso com o longo prazo foi uma das novidades apresentadas. “Isso tem a ver muito com o nível de competitividade alcançado pela fonte”, conta Abranches, da EDF Renewables. O contrato com a Braskem é de 20 anos.As estratégias usadas para expansão no mercado livre tem sido as mais variadas possíveis. Há desde o parque exclusivo para o ambiente de contratação livre, como as extensões de projetos viabilizados em leilões de energia, em que se enquadra o projeto da Braskem. Esse último modelo acabou se demonstrando uma boa estratégia. Para Camila Ramos, da Cela Experts, o parque misto traz garantia de rentabilidade e tem o menor risco, devido a garantia do contrato de longo prazo. “Essa é uma boa estratégia mais conservadora para entrar no mercado livre”, avisa. Já no caso dos parques exclusivos para o ACL, o retorno pode ser maximizado, já que existe uma flexibilização maior de negociação da energia gerada durante a vida útil do contrato.Outra movimentação importante nesse aumento de renováveis no ACL foi a dos fabricantes de aerogeradores. Tendo que absorver os impactos dos anos com de baixa ou nenhuma contratação, era interessante para eles venderem equipamentos e realizassem negociações com comercializadoras e geradoras. Para a Vestas, que é a fornecedora para os parques no ACL da Casa dos Ventos e da Echoenergia, o crescimento do mercado livre está diretamente ligado a disparidade entre os preços do regulado e o preço spot, como o que é visto atualmente. A hidrologia ruim e o aumento no preço da energia fazem com que os seus clientes se voltem para o mercado livre que nesse cenário traz uma remuneração melhor que os projetos voltados exclusivamente ao mercado regulado.O projeto da Casa dos Ventos é um mix de ACR e ACL, enquanto o da Echoenergia é totalmente voltado para o mercado livre. “Acreditamos que em 2019, teremos possibilidade de ver novos projetos com esses mesmos perfis”, revela o presidente da empresa, Rogério Zampronha. A fabricante vai usar nos projetos a turbina V150 – 4.2 MW, a maior a ser fabricada no Brasil até o momento. O executivo tem observado um movimento importante na procura por projetos para o mercado livre, em que muitas vezes estão ligados a projetos associados ao mercado regulado.
Ainda sem a força das eólicas, a energia solar também vem despontando no mercado livre. Recentemente, a Powertis anunciou que vai construir 1 GW no Brasil a partir de 2020 e que quer ser a líder da fonte no mercado livre. Com a autoridade de quem fechou o primeiro contrato de energia incentivada no país – a energia da PCH Coqueiro foi vendida para um grupo de telefonia em 2003 – a Electra Energy também trabalha com a comercialização de energia solar. Ela atua com recebíveis de longo prazo, de 10 e 12 anos de duração.Para o vice-presidente de Operações da Electra Energy, Claudio Fabiano Alves, o preço da solar ainda é um pouco maior que o da eólica, o que influencia na escolha. Segundo ele, ela traz características positivas, como a velocidade de implantação, que é mais rápida que a eólica e operação mais simples. “Ela acaba sendo competitiva em outros aspectos que agora a gente percebe que o mercado está notando esses parâmetros”. Ele tem a percepção que a fonte vai crescer bastante nos próximos anos.
Para manter o ritmo de contratações que o ACL vem apresentando desde 2018, é fundamental resolver a financiabilidade dos projetos, uma vez que mesmo que o BNDES tenha aprimorado seus mecanismos, haverá gargalos. É preciso entender qual a bancabilidade dos compradores de energia, além de outros temas que trazem discussão. “A gente vai conseguir financiar projetos só com consumidor final de energia ou com os que possuem contrato com trading? Como lidar com financiabilidade dos projetos não tão longos?”, indaga Camila Ramos, da Cela.A presidente da Abeeólica, Élbia Gannoum, também elege a questão da financiabilidade como elemento fundamental na manutenção da intensidade do deslanche da fonte no ACL. Segundo ela, a melhora nas condições do BNDES são classificados por ela como mitigadores e não como soluções finais. A executiva revela que se reuniu com o presidente Joaquim Levy, pedindo mais atenção para esse mercado que está surgindo e que ele tenha um modelo desenhado. “Hoje não temos um desenho concreto para o mercado livre”, aponta.Já a necessidade de projetos competitivos, além da financiabilidade. é destacada pelo CEO da EDF Renewables, Paulo Abranches. “Não dá para prever se essa ‘janela de oportunidades’ que juntou preços baixos, alta competitividade e boas condições de financiamento vai continuar nos próximos anos. É possível que dependendo do volume dos próximos leilões e dos preços, vá influenciar o mercado livre”, observa.
Olhar para o mercado livre como nicho de mercado é o que Reginaldo Medeiros, presidente executivo da Abraceel, recomenda para o ritmo de contratação de renováveis não cair. Com a escassez de leilões, ele vê a busca pela viabilização de empreendimentos no ACL como um futuro natural dos agentes. “Os projetos estão aí, tem centenas. Os empreendedores estão olhando, vai ser uma tendência”, avisa. Zampronha, da Vestas, acredita que o aquecimento econômico do país vai garantir a necessidade de geração de energia. Ele também pede atenção a movimentação lateral do mercado regulado para o mercado livre, que não faz crescer o mercado, mas altera o ritmo de contratação do ACL.Fonte: Canal Energia
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